Agência marítima no Brasil: como são feitos os contratos

  • 28/04/2020
  • 12 minutos

O papel de uma agência marítima ou, em inglês, uma shipping agency, no Brasil, é regulado por uma série de dispositivos legais, portarias e outras normas. No entanto, o comércio internacional apresenta uma peculiaridade: como os casos julgados podem acontecer em alto-mar, torna-se mais complexo estabelecer que lei será usada. 

Nesse aspecto, um contrato de agenciamento marítimo (shipping agency) precisa ser muito bem redigido. Afinal, em caso de descumprimento ou de conflito de interesses, as responsabilidades têm que ser muito bem apuradas para estipular reparações justas.

Para falar sobre esse tema, a Wilson Sons convidou o seu gerente de negócios Luiz Maluza. O especialista tem esclarecimentos de interesse para quem opera no comércio internacional ou mesmo estuda sobre o assunto. Acompanhe nos próximos tópicos.

As relações contratuais nos negócios internacionais

Atualmente, com a fluidez e a velocidade das informações e, consequentemente, das transações comerciais, tanto no Brasil como no mundo, os cenários estão em constante mudança. Assim, existe o temor de que, durante as negociações entre parceiros comerciais e a usual necessidade de contratação e urgência nas demandas, muitas vezes o contrato não seja visto como elemento essencial.

Naturalmente, uma agência marítima (shipping agency), no Brasil está sujeita a normas comuns às que atuam em operações no comércio internacional .

Contudo, tanto em âmbito nacional como internacional, não se pode afastar a importância de um contrato. O instrumento é, e sempre será, a expressão máxima do acordado entre as partes. Quando falamos de parceiros comerciais em países diferentes, sujeitos às legislações e costumes diferentes, mais do que nunca se faz necessário um instrumento capaz de dirimir eventuais conflitos e traduzir de forma inequívoca as intenções das partes.

Sobre o contrato firmado por uma agência marítima, Maluza destaca que “as funções desempenhadas pelo agente marítimo são complexas e envolvem prestações disciplinadas por diversas normas. O contrato firmado entre armador — ship owner — e agência inclui as tarefas de administração do navio e sua operação, não lhe concedendo poderes para atuar em nome deste sem mandato específico. Já ao armador compete intervir nas questões legais que envolvem a carga, além de prestar o atendimento direto aos seus clientes.

Dessa forma, o contrato firmado entre o armador e agência marítima estipula que o agente marítimo seja mandatário, ainda que por comodidade, autoridades locais queiram entender que isto é uma representação.

As limitações e responsabilidades da agência

Nesse caso, o gerente de negócios da Wilson Sons ressalta: “uma coisa é ser mandatário e, outra, totalmente diferente, é atribuir responsabilidade como representante. A atuação do agente marítimo ocorre por conta e em nome do seu mandatário armador — ship owner — ou operador de transporte — ship operator. O agente marítimo — shipping agent — não é o afretador do navio — charterer —, não manuseia a carga, tampouco é transportador, não executa o transporte e, muitos menos, tem poderes para contratar frete — atividade exclusiva dos agentes de carga, freight forwarders e NVOCCs. Essa é a razão pela qual a agência marítima não deve ser apontada como responsável pelas ações praticadas pelo armador, operador de transporte ou afretador, no exercício de seu ofício”.

Uma agência marítima, portanto, tem responsabilidades bastante limitadas. Por agir apenas como mandatária, nos termos do artigo 663, do Código Civil, responde apenas nos limites das suas obrigações. Ou seja, cabe ao mandante se responsabilizar por todo e qualquer imbróglio surgido durante a execução do contrato, caso o mandatário tenha agido nos estritos termos do mandato. Inclusive existem decisões do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido.

De qualquer forma, uma shipping agency no Brazil não difere de suas congêneres no cenário internacional. Isso se considerarmos que todas devem responder por seus atos conforme as decisões da Baltic and International Maritime Council (BIMCO), maior associação de armadores do mundo, e da Federation of National Associations of Ship Brokers and Agents (FONASBA).

Sobre esse órgãos, Luiz Maluza lembra que eles “lançaram um modelo padrão de contrato no sentido de formalizar a relação entre contratantes e contratados nas modalidades de serviços de agenciamento marítimo.”

Os casos em que a contratação de uma agência é indicada

“Ainda que esses contratos possam ser adaptados e alterados conforme as necessidades ou particularidades de cada negócio, eles devem servir como padrão. Isso os torna indispensáveis também em acordos pontuais de agenciamento e para contratos de longo prazo”, destaca Maluza.

Essa aplicação ampla, por outro lado, aumenta as possibilidades em que a contratação de uma agência marítima no Brasil possa se fazer necessária. Afinal, estamos em um país dotado de 7.941 quilômetros de costa, ideais para a navegação doméstica e que torna a cabotagem um importante meio de se escoar e distribuir a produção.

Os erros a serem evitados ao firmar contratos

Luiz Maluza também ressalta a importância das regras determinadas pela BIMCO e FONASBA uma vez que “armadores e agentes nem sempre tiveram contratos formais. Algumas relações comerciais funcionaram até agora sem a utilização desses contratos, ainda que sempre exista o risco de divergências sobre pagamentos, escopo de serviços e responsabilidades e, até mesmo, qual legislação adotar em caso de divergência entre as partes. Sem referências para respaldar interesses diversos, a prática mostra que o agente normalmente fica com o prejuízo.”  É importante assinalar ainda que os instrumentos pré-contratuais, tais como carta de intenções e memorando de entendimentos (MoU), podem auxiliar as partes antes da formalização do instrumento em si.

O especialista enumera, ainda, os erros mais recorrentes na relação entre armadores, transportadores e agências quando não observam os riscos de operar sem contrato:

  • não alinhamento de escopo e responsabilidades das partes;
  • impossibilidade de resolver casos omissos;
  • falta de amparo para cobranças;
  • maior vulnerabilidade do relacionamento entre as partes.   

E emenda, destacando as vantagens de se trabalhar protegido por esse instrumento: “o contrato é a ferramenta fundamental para que uma relação de negócios seja respeitada e satisfatória para ambas as partes. Ele é o regulador de tudo que envolve o serviço contratado, incluindo como será a execução dos trabalhos, a definição dos prazos, entre outros pontos.

O contrato é o meio pelo qual as partes demonstram as suas intenções, e por isso seu princípio norteador é a boa-fé objetiva. Mais do que termos complexos ou o usual jargão jurídico, um contrato precisa ser claro no que pretende de ambas as partes. A tendência é que sejam cada vez mais simples, para que aqueles que o negociam sintam-se à vontade para fazê-lo, sem receio de contratar algo com o qual não concordam.

Os termos mais utilizados nesse mercado

Uma agência marítima no Brasil deve trabalhar sempre atenta aos termos mais comuns utilizados no comércio exterior. Assim, seus contratos serão melhor redigidos, garantindo a segurança jurídica necessária. Nesse sentido, Luiz Maluza finaliza apontando para alguns dos mais frequentes:

  • agreement — o acordo assinado e validado entre agência, transportador e armador;
  • agent — profissional responsável por intermediar a relação entre armador e transportador;
  • disbursement of accounts — prestação de contas, custeio;
  • fee — taxa ou emolumento a ser pago por algum tipo de operação embarcada ou em terra;
  • husbandry – atividades relacionadas com a escala do navio
  • proforma — estimativa de custeio da escala;
  • port call — escala no porto;
  • spot — expressão usada para se referir a operações de curto prazo.

Para finalizar, Luiz acrescenta: “a constância de inovação também impacta o universo jurídico. Ou seja, novas formas de negócios surgem e, por isso, cabe ao ordenamento se adaptar e regular essas tendências e inovações”.

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