O que esperar das mudanças de combustível no transporte marítimo

  • 03/12/2019
  • 9 minutos

O uso de combustível no transporte marítimo está em um processo de adaptação que, em 2020, terá o seu marco zero. As mudanças previstas, por sua vez, têm como justificativa o esforço global em reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa.

Sendo assim, cabe aos profissionais que atuam nesse comércio adequar suas operações o quanto antes, considerando que falta pouco tempo para o início do novo ano.

Para trazer mais informações sobre essa nova fase que está por vir, contamos com a participação de Márcio Castro, diretor de operações da Wilson Sons Rebocadores. Também tivemos a presença de Renato Graça Couto, Chartering and Project Division da Hansa Mayer Global.

Quais as novas exigências para o combustível no transporte marítimo?

De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, o dióxido de enxofre (SO2) é um dos mais nocivos gases com origem em atividades humanas. Ele resulta da queima de combustíveis fósseis e, além de colaborar para agravar o efeito estufa, causa problemas respiratórios graves.

Portanto, é necessário um esforço no sentido de mitigar ou neutralizar a emissão dessa substância no ar atmosférico. Segundo Márcio Castro, esse é o propósito da International Maritime Organization (IMO), ou seja, reduzir a concentração desse material no combustível no transporte marítimo.

De acordo com o especialista, o órgão determina que “os combustíveis usados por navios e embarcações de menor porte somente poderão conter 0,5% de enxofre em sua composição a partir de 1º de janeiro de 2020. Essa é a orientação da IMO, agência da ONU que cuida de questões de segurança na indústria marítima e da redução da poluição marinha e atmosférica.”

Castro acrescenta que o regulamento já havia sido publicado em 2016. Ou seja, desde então, as empresas que atuam no comércio internacional e de combustíveis vêm se adaptando até que a obrigatoriedade fosse instituída.

Atualmente, a agência permite que seja utilizado combustíveis contendo até 3,5% de enxofre em sua composição. Com a redução nesse teor, espera-se que haja uma significativa redução na emissão de gases do efeito estufa, contribuindo, assim, para o alcance das metas climáticas da ONU.

Quais os benefícios da mudança?

As mudanças nas especificações para produção de combustível no transporte marítimo trazem como benefício imediato a redução do impacto ambiental pela navegação. Contudo, de acordo com Renato Graça Couto, é possível que haja algum ganho nos custos operacionais a longo prazo. Como os motores estarão queimando um combustível de melhor qualidade, isso poderá reduzir os custos de manutenção das embarcações.

Renato acrescenta que “esse processo de mudança já aconteceu com o diesel rodoviário. Em função da questão ambiental, a indústria marítima também teve que se adaptar. A partir de agora, os armadores também precisarão aderir ao uso de combustíveis menos poluentes.”

Portanto, o que se espera é que a nova especificação seja efetiva no sentido de ajudar a cumprir as projeções da ONU para 2030. Para as Nações Unidas, o uso de tecnologias de baixo impacto ambiental desde já pode ajudar a tirar da atmosfera 33 gigatoneladas de CO2 nos próximos 11 anos.

Além disso, o novo combustível a ser utilizado pode gerar novas receitas para a Petrobrás. Antes, a multinacional brasileira só fornecia o insumo com até 3,5% de teor de enxofre para o mercado interno, mas já notificou que seu combustível marítimo para bunker estará dentro das normas ainda em outubro. Aliás, pelas novas regras, o petróleo extraído do pré-sal será ainda mais valorizado, uma vez que seus níveis de enxofre já estão dentro dos novos limites.

A expectativa é tão alta que a atual diretoria da estatal acredita que essa modificação deverá representar o início de uma nova era dourada para a empresa. Por isso, já há planos para retomar as atividades de distribuição e venda em Cingapura, o maior consumidor de High Sulphur Fuel Oil (HSFO) do mundo.

Quais as prováveis dificuldades?

De qualquer forma, o esforço em prol do meio ambiente deverá cobrar seu preço. Márcio Castro e Renato Graça concordam nesse aspecto, já que o novo combustível Low Sulphur Fuel Oil (LFSO) será mais caro.

Considere-se, ainda, que a entrada repentina de LFSO no mercado a partir de 2020 provocará uma demanda estimada de 4 milhões de barris desse insumo por dia. Assim sendo, é certo que os preços do combustível serão inflacionados, gerando repercussões em toda a cadeia de suprimentos global.

Vale destacar, ainda, uma entrevista que Eddie Gauci, da British Petroleum, deu à agência Thomson Reuters. Para o executivo, os investimentos necessários para adequar as refinarias à nova realidade já chegaram a 1 bilhão de dólares e o processo adaptativo continua. Por isso, as estimativas é que, no começo de 2020, apenas um terço da demanda por LFSO poderá ser atendida.

Como se adequar às novas normas?

Diante da esperada falta do novo combustível e dos preços inflacionados, pelo menos nesse começo das operações, algumas alternativas devem ser consideradas. Uma delas, conforme Márcio Castro aponta é “utilizar sistemas que limpam os gases liberados da combustão, conhecidos como scrubbers ou depuradores, que da mesma forma, reduzem a poluição atmosférica.”

Uma medida adicional, para os especialistas, é a conversão dos motores das embarcações para uso de Gás Natural Liquefeito (GNL) como combustível. Segundo Renato “novos projetos de navios deverão também optar por esta configuração, que vem a ser menos poluente.”

Todo esse novo contexto deverá provocar flutuações internacionais nos valores dos fretes/surcharges. Como consequência, os armadores tentarão repassar os custos operacionais para cobrir as despesas extras em função da entrada do LFSO.

Também existe um panorama de incerteza quanto às bunker surcharges a serem aplicadas futuramente pelos armadores. Ou seja, enquanto o mercado não se consolidar, a solução mais rápida para poupar custos com combustíveis é adaptar os motores das embarcações.

Márcio Castro confirma esse prognóstico, “o desafio imediato é em relação ao preço cobrado pelos combustíveis marítimos com menor teor de enxofre, consideravelmente maior. Os armadores que optarem pelo sistema que limpa os gases, ou pelo GNL, precisarão fazer um grande investimento na conversão da frota. Em todos os casos, existe a expectativa de um crescimento no custo do frete marítimo internacional.”

Renato Graça finaliza “o novo combustível no transporte marítimo aumentará o custo operacional. Sendo assim, a tendência é termos um aumento no custo dos fretes, pelo menos no início da implementação das novas regras.”

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